
Por que o Comando Militar do Sudeste (CMSE) está interessado na crise da falta de água em São Paulo?
A resposta veio na tarde
da última terça-feira, 28 de abril, durante o painel organizado pelo
Exército, que ocorreu dentro de seu quartel-general no Ibirapuera, zona
sul da capital paulista.
Durante mais de três
horas de debate, destinado a oficiais, soldados e alguns professores
universitários e simpatizantes dos militares que lotaram o auditório da
sede do comando em São Paulo, foi se delineando o real motivo do alto
generalato brasileiro estar preocupado com um assunto que aparentemente
está fora dos padrões de atuação militar.
A senha foi dada pelo
diretor da Sabesp, Paulo Massato, que ao lado de Anicia Pio, da Fiesp
(Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), e do professor de
engenharia da Unicamp, Antonio Carlos Zuffo, traçaram um panorama sobre
como a crise hídrica está impactando o Estado paulista.
Massato foi claro. Se as
obras emergenciais que estão sendo feitas pela companhia não derem
resultado e se chover pouco, São Paulo ficará sem água a partir de julho
deste ano. O cenário descrito pelo dirigente da Sabesp é catastrófico e
digno de roteiro de filme de terror.
“Vai ser o terror. Não
vai ter alimentação, não vai ter energia elétrica… Será um cenário de
fim de mundo. São milhares de pessoas e o caos social pode se deflagrar.
Não será só um problema de desabastecimento de água. Vai ser bem mais
sério do que isso…”, enfatiza durante sua intervenção, para na sequência
lançar uma súplica de esperança: “Mas espero que isso não aconteça”.
Ele destaca que na
região metropolitana de São Paulo vivem 20 milhões de pessoas, quando o
ideal seriam quatro milhões. Destas, segundo Massato, três milhões
seriam faveladas que furtariam água. “Furtam água ou pegam sem pagar”,
conta, arrancando risos da platéia.
Blindagem
Nenhuma crítica, no entanto, foi
dirigida ao governador Geraldo Alckmin (PSDB) pelos presentes durante
todo o evento. Apenas uma pessoa se manifestou durante a fala de
Massato, afirmando que faltou planejamento estatal. Mas foi interrompido
por uma espécie de mestre de cerimônias do comando militar que
ciceroneava o evento, pedindo que ele deixasse a questão para as
perguntas a serem dirigidas aos debatedores. A pergunta não voltou a ser
apresentada.
Mas o resultado pela falta de investimento e planejamento do governo paulista já provoca calafrios na cervical do establishment do
Estado. As cenas de Itu podem se reproduzir em escala exponencial na
região metropolitana de São Paulo. E é contra isso que o Exército quer
se precaver.
O dirigente da Sabesp citou um caso que
ocorreu na região do Butantã, zona oeste da capital. De acordo com ele,
houve uma reação violenta porque a água não chegou em pontos mais altos
do bairro. “Não chegou na casa do ‘chefe’, e aí ele mandou incendiar
três ônibus. Aqui o pessoal é mais organizado…”
Em sua intervenção, a dirigente da
Fiesp, Anícia Pio, frisa que muito se tem falado sobre a crise de
abastecimento da população, mas que não se pode desconsiderar o impacto
sobre a indústria paulista. “A crise só não foi maior, porque a crise
econômica chegou (para desacelerar a produção).”
De acordo com ela, o emprego de milhares
de pessoas que trabalham no setor está em risco se houver o agravamento
da crise hídrica.
Se depender das projeções apresentadas
pelo professor Zuffo, da Unicamp, a situação vai se complicar. Segundo
ele, o ciclo de escassez de água pode durar 20, 30 anos.
A empresária destaca
ainda que não se produz água em fábricas e que, por isso, é preciso
investir no reuso e em novas tecnologias de sustentabilidade. E critica o
excesso de leis para o setor, que de acordo com ela é superior a mil.
O comandante militar do
Sudeste, general João Camilo Pires de Campos, anfitrião do evento, se
sensibilizou com as criticas da representante da Fiesp e prometeu
conversar pessoalmente com o presidente da Assembléia Legislativa de São
Paulo, deputado Fernando Capez (PSDB), sobre o excesso de legislação
que atrapalha o empresariado.
Ele também enfatiza que é
preciso conscientizar a população sobre a falta de água e lamenta a
grande concentração populacional na região. “Era preciso quatro milhões e
temos 20 milhões…”, afirma se referindo aos números apresentados por
Massato.
O general Campos destaca
a importância da realização de obras, mas adverte que “não se faz
engenharia para amanhã”. E cita para a plateia uma expressão do
ex-presidente, e também general do Exército, Ernesto Geisel, para
definir o que precisa ser feito. “O presidente Geisel dizia que na época
de vacas magras é preciso amarrar o bezerro.”
“Não há solução fácil, o problema é sério”, conclui o comandante.
Sério e, por isso,
tratado como assunto de segurança nacional pelo Exército. O crachá
distribuído aos presentes pelo Comando Militar do Sudeste trazia a
inscrição: Painel sobre defesa.
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